Depois de passar por uma dúzia de praias vazias entre paredões dourados, o barco atraca num canto de oceano cercado por rochas calcárias, cavernas e arcos. Nas Ilhas Cíclades, o mar é azul-turquesa, azul-cobalto, azul-esmeralda, cristalino como jamais pensei encontrar. No topo da rocha, há meia dúzia de barracas de camping. O capitão me explica que ali, na ilha de Kato Koufonisia, não há hotéis. Me surpreendo; não estou num pedaço isolado do planeta, mas na vizinhança entre Mykonos e Santorini, na agitada rota dos ferryboats. Minha surpresa só aumenta, aliás, quando ele me fala que a ilha também não tem luz nem água e, tirando uma igreja (e seu provável pároco), é completamente desabitada.

A ilha irmã de Kato Koufonisia – separada dela por um estreito canal de mar – é Pano Koufonisia, essa sim habitada, mas nem tanto: apenas mil moradores vivem ali naquele microponto de beleza com seis quilômetros de extensão. Mas atente que há cinco anos eram só 300 pessoas, então esse pequeno e intocado paraíso está em franca descoberta. Portanto, há que se ir logo. Ambas são algumas das muitas preciosidades reservadas pela rota das Ilhas Cíclades, circuito facilmente organizável de ferryboat. Mas antes de chegar a elas, há muitas outras no caminho.

Milos: a ilha do amor

Primeiramente, partindo de Atenas, a parada do roteiro pelas Ilhas Cíclades é Milos, que, como a estátua da deusa Vênus – retirada dessa ilha em 1800 pelos franceses e hoje parte do acervo do Louvre –, é uma hipnose de amor. Basta botar os pés aqui e, assim que você for embora, vai morrer de saudades e suspiros.

Milos nasceu de explosões. Isso porque ela emergiu em meio a erupções sob o oceano e terremotos, e o resultado é uma ilha exuberante e com paisagens dramáticas esculpidas em rochas vulcânicas. Embora já seja parte da rota turística das Ilhas Cíclades, o movimento aqui ainda não é massivo. E mesmo na alta estação, é possível achar boas pousadas e estúdios entre € 80 e € 120. Já os passeios de barco de dia todo custam, na baixa, a partir de € 50, e na alta (verão, especialmente julho e agosto), cerca de € 80.

A ilha tem pouco mais de 150 km², com 41 praias e três graciosos vilarejos de casas brancas. O mais agitado deles é Adamas, onde ficam o porto, restaurantes, pousadas, café e agências de passeios, por exemplo. É uma localização prática para quem quer estar perto das atrações e do agito. Já Pollonia é mais charmosa e aconchegante, e à noite tem muitos restaurantes gostosos. O melhor da ilha é, sobretudo, o Enalion, que fica por essas bandas e serve pratos típicos. Plaka fica no alto da montanha, e é o mais pitoresco dos vilarejos. Mas não é a melhor localização para hospedagem, embora valha muito uma visita ao entardecer – já que de lá se tem uma vista privilegiada do pôr do sol –, emendando com um jantar.

Em Milos, é necessário carro, já que a ilha carece de transporte público. Leva-se pouco mais de meia hora para ir de norte a sul, mas no curto caminho há um desfilar de praias maravilhosas que distam pouco tempo uma da outra.

Praias secretas

Começa por Sarakiniko, no lado sul, talvez uma das mais belas e onde a areia dá lugar a um chão de calcário irregular com aspecto lunar, cavernas e rochedos ideais para saltos na água. Seis quilômetros adiante, fica outra praia que a natureza levou milhares de anos para desenhar. Papafragas é um rasgo de mar aberto na rocha, com cavernas e acessos a pequenas baías. Há um estacionamento logo acima, mas é preciso descer uma estreita e escorregadia trilha entre as pedras para nadar na piscina de águas esmeralda.

Do outro lado da ilha, num trajeto que saindo de Papafragas dura apenas meia hora de carro, fica a belíssima Firiplaka, com um rústico beach club, onde se pode almoçar uma ótima salada e alugar um par de espreguiçadeiras com barraca. Além disso, é do lado de Firiplaka que está outra das praias imperdíveis em Milos: a selvagem Tsigrado.

Chegar a ela exige um pouco de coragem e disposição. Afinal, a passagem para a areia se dá por meio de uma fenda entre o rochedo, equilibrando-se numa escada improvisada. Mas aqui vale a máxima de que os lugares mais difíceis de chegar são também os melhores: a pequena baía protegida por pedras e cavernas tem mar estourando de azul e nenhuma barraca. Preservada como deve ser o paraíso.

No mar, e apenas acessível de barco, reside um dos tesouros de Milos: o Kleftiko, outro antigo esconderijo de piratas. Lá, uma lagoa azul se esconde protegida por cavernas e rochas de calcário de proporções magnânimas. O passeio para esse ponto da ilha pode ser feito de duas formas, e ambas valem a pena: dando a volta na ilha e indo até a vizinha Poliegos ou explorando apenas o seu lado oeste.

Milos, Grécia
Plaka (foto: shutterstock)

 

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Mykonos: a ilha mais badalada

Em seguida, saindo de Milos, o ferryboat leva cinco horas para chegar à nossa próxima parada: Mykonos, a mais festeira e sexy das Ilhas Cíclades. É a resposta grega para Ibiza, e no mês de julho, prepare-se para encontrar congestionamentos em alguns trechos, praias cheias e preços inflacionados. Até agosto, os valores de pousadas simples não saem por menos de € 200. Mas ainda assim vale a pena vir no verão. E mesmo em Mykonos, com todo o avanço turístico, há praias intocadas. Aliás, ela é democrática e há de tudo aqui, para todos os gostos e bolsos.

Se a sua praia é badalação, há uma infinidade de beach clubs. Para quem gosta de luxo, o Nammos, situado num pedaço protegido e brilhante de Psarou, cairá como uma luva. Biquínis Missoni, Gucci e Prada se misturam com a areia dourada. Ver gente é um ritual por aqui, com multidões flertando e dançando a noite toda – boa parte em cima das mesas. Os mais afortunados se reunirão nas cabanas (na verdade, uma espécie de estúdio com piscina privativa) com capacidade para seis pessoas e tudo incluso. Além disso, o Nammos também tem um shopping de grife e um restaurante onde o forte são as lagostas e as massas trufadas.

Menos suntuosos e com clima mais descontraído, o Scorpios e o Alemagou atraem uma clientela cool e não deixam a dever nada em relação ao agito. O Alemagou, inclusive, hospeda festas memoráveis com os melhores DJs do mundo, com cabanas para até oito pessoas e fins de tarde douradíssimos. No Scorpios, a cabana custa € 150 para quatro pessoas.

Praias, tavernas e restaurantes

Dos pedaços de areia mais isolados, a lista começa com Fokos e Kapari, duas enseadas entre paredões rochosos, com acesso por estrada de terra. Kapari não tem absolutamente nada e é uma pequena beleza. Já em Fokos, há apenas uma pequena taverna antes de chegar à areia, que serve comida muito boa. Aliás, falando em comer bem, há também a taverna Markos, em Kalafatis, uma praia metade organizada e metade sem cadeiras.

Mas é Agios Sostis que ganha o título de preciosidade. A praia, dividida em duas por uma rocha, tem mar tinindo de azul e uma pequena igrejinha abobadada. No caminho para esse paraíso, degraus acima da praia, fica um dos restaurantes mais historiados de Mykonos, o Kiki’s. Para ele, há sempre filas, que chegam a demorar duas horas, mas regadas com rosé de cortesia. Kiki em pessoa cuida de organizar a espera, mas não anota o nome de ninguém: você fica aqui, ela ali, e assim vai. Faz parte do charme do lugar, e no final tudo fica certo. Então, quando vier para essas bandas, prepare-se para mergulhar no mar, esperar, almoçar e voltar ao mar.

História e arquitetura em Chora

No fim do dia, rume assim como todos para Chora. De preferência, chegue antes do pôr do sol, que é sensacional se visto da chamada Little Venice, o calçadão de bares brancos e azuis adornados com primaveras, cartão-postal da ilha. É nesse ponto também que ficam os moinhos, construídos no século 16 por mercadores venezianos para moer o trigo vendido na rota marítima da Ásia. Depois, suba pelo Kastro até a igreja de Panagia Paraportiani, que começou a ser construída em 1425 e só foi finalizada 300 anos depois. Ela, na verdade, é uma junção de cinco outras igrejas que formam um gracioso conjunto.

Aqui vale uma pausa para explicar a história: a Grécia foi subjugada pelo Império Romano e Bizantino, e com a queda de Constantinopla, passou para as mãos dos venezianos, para enfim ser conquistada pelos otomanos. Todo esse passado está escrito na arquitetura de Mykonos: as igrejas ortodoxas, as casas brancas em formato de cubo e sem telhado – projetadas pelos antigos moradores com materiais simples e locais e sempre adaptadas a elementos como o sol e o vento… Tudo isso faz de Mykonos e de sua pequena cidadela um lugar único.

Por isso, guarde fôlego para se perder pelas ruelas tomadas por casinhas com balcões de madeira pintada e numerosos cafés, bares e restaurantes. Se quiser um jantar romântico, o Kastro’s é ótimo. No entanto, para embalar noite adentro, há dezenas de clubes noturnos em Chora, com um desfilar de gente fina e elegante.

Mykonos, Ilhas Cíclades
Igreja de Panagia Paraportiani (foto: shutterstock)

Paros: herança dos pescadores

De Mykonos para Paros, são rápidas duas horas de ferryboat. Mais verde, mais quieta e bucólica, Paros ainda guarda as origens de uma ilha de pescadores. Por isso, é fácil ver aqui os varais de polvos e os pescadores voltando de um dia de labuta no mar. Quem sai do trânsito babilônico de Mykonos e desembarca por essas bandas até estranha a quase ausência de carros nas estradas. E certamente agradece.

À beira-mar fica Naousa: o vilarejo mais charmoso de Paros é uma Chora em versão reduzida, só que num tempo mais calmo e com um dresscode mais relax. O romântico vilarejo tem ruas estreitas, casas brancas com sacadas e portas coloridas, cafés e restaurantes deliciosos como o Soso, que serve pratos gregos com roupagem contemporânea, ou o Mediterraneo, de frente para um pequeno porto e com menu de peixes, boa parte pescada por lá mesmo.

Derramando casinhas brancas sobre as montanhas centrais, está a pitoresca Lefkes, primeira capital da ilha, que merece muito a sua visita. Já Parikia, a capital atual e onde fica o porto, é um pouco maior e mais movimentada. Além de agências, hotéis e mercados, preserva alguns monumentos da Grécia Antiga. Entre os exemplares, estão as ruínas do templo de Asclepion e a Igreja Ekatontapiliani, datada do século 4º e construída a mando de Helena, mãe do imperador romano Constantino. E também as ruínas do Delion, o santuário de Apolo e Artemis usado pelos gregos até o século 4º a.C. Para se hospedar, prefira Naousa e Parikia. Dentre as praias, as mais lindas de Paros são Lolantonis, Kalogeros, Kolimbitres, Ampelas e Glyfa.

Naousa, Paros
Paros, Ilhas Cíclades (foto: shutterstock)

Koufonisia: o grande segredo

O imperdível aqui são, acima de tudo, os passeios de barco para Antíparos com suas lagoas azuis e para a vizinha Koufonisia – e aqui voltamos ao início desta reportagem: a pérola intocada das Ilhas Cíclades. Saindo de Paros, do porto de Piso Livadi – um pequeno e fofo vilarejo –, o passeio de barco para as duas Koufonisias leva dez horas, com quatro paradas para mergulho em lugares de tirar o fôlego de tão lindos. Há poucas agências que fazem esse tour, como a do capitão Yannis, por exemplo. Outra possibilidade é ir de ferry para Pano Koufonisia e passar alguns dias na ilha, que é o que mais recomendo.

Pano Koufonisia ainda é uma ilha de pescadores mais do que de turismo. E o melhor é que aqui carro não faz sentido. Você toma um taxi boat e vai pelas praias. Ou anda a pé, de uma para outra, numa costa que se estende por quatro quilômetros. Do meio para o final, a paisagem vai ficando mais e mais bonita, com dezenas de enseadas e piscinas naturais sem nome, e as lindíssimas Platia Pounda, Pori e Gala. Esta última é uma pequena praia dentro de uma gruta. Por fim, não deixe de fazer o passeio de barco para a vizinha Kato Koufonisia, a maior e selvagem das duas ilhas. Uma versão deserta do paraíso grego.

 

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